
Todo começo de ano traz uma pergunta silenciosa: “como eu quero viver os próximos meses?”. A campanha janeiro branco 2026 reforça exatamente isso: o modo como cada pessoa cuida da própria saúde mental e organiza prioridades para o novo ciclo.
No trabalho, esse olhar ganha ainda mais peso. O ambiente profissional ocupa grande parte do dia, da energia e das emoções. Por isso, a forma como a empresa estrutura metas, liderança, carga de trabalho e apoio emocional influencia diretamente o bem-estar dos colaboradores.
E é aqui que o RH se torna essencial: transformar intenção em prática, cultura e políticas que realmente apoiam pessoas, especialmente em momentos difíceis. Este conteúdo mostra como o Janeiro Branco pode ser o ponto de partida para fortalecer a saúde mental no trabalho ao longo de todo o ano.
Como surgiu o movimento Janeiro Branco?
O movimento começou em 2014, em Uberlândia (MG), criado pelo psicólogo Leonardo Abrahão e outros profissionais da área. A inspiração veio de campanhas como Outubro Rosa e Novembro Azul, mas voltadas para um tema ainda rodeado por tabu: a saúde mental.
A percepção era clara: faltava uma campanha ampla e acessível, que tratasse de emoções, propósito, relações, ansiedade, depressão e prevenção ao suicídio de forma próxima do dia a dia. Janeiro foi escolhido por simbolizar recomeço, reorganização de prioridades e uma folha em branco para novas escolhas.
Desde então, o Janeiro Branco cresce no Brasil e alcança empresas, escolas, instituições públicas e a mídia. Em 2026, segue com o mesmo propósito: mostrar que cuidar da mente é um direito e uma responsabilidade coletiva, e não um luxo individual.
Tema da campanha Janeiro Branco 2026: Paz, Equilíbrio e Saúde Mental
De acordo com Leonardo Abrahão, presidente do Instituto Janeiro Branco, a campanha janeiro branco 2026 propõe um gesto simbólico muito forte: ressignificar o post-it. Um item frequentemente associado à urgência, pressão e prazos agora se transforma em símbolo de mobilização social e cuidado com a saúde mental.
Cada post-it passa a representar um lembrete de que a mente precisa de atenção diária. Nas empresas, ele entra em murais, agendas e canais digitais como recado constante: resultados importam, mas a saúde emocional importa tanto quanto.

Além disso, o tema do janeiro branco 2026 reforça três pilares, convidando a sociedade a rever a forma como lida com o mundo e com as próprias emoções:
- Paz, como serenidade e lucidez para atravessar o caos cotidiano.
- Equilíbrio, como prática contínua que sustenta relações saudáveis, limites claros e qualidade de vida.
- Saúde mental, como prioridade coletiva e não responsabilidade isolada de quem já está no limite.
Por que a saúde mental no trabalho tornou-se urgente?
A OMS aponta que milhões convivem diariamente com transtornos mentais. No ambiente de trabalho, isso aparece como:
- aumento de afastamentos;
- queda de produtividade;
- conflitos internos;
- clima de tensão constante.
Ao mesmo tempo, cresce a expectativa dos colaboradores por ambientes mais humanos. As pessoas esperam segurança psicológica, reconhecimento, apoio emocional e equilíbrio entre vida pessoal e profissional — não apenas salário.
Na avaliação de Abrahão, o maior desafio das organizações ainda é tratar a saúde mental como algo pontual, restrito a datas específicas do calendário. Para ele, o Janeiro Branco só cumpre seu papel quando deixa de ser um evento isolado e passa a influenciar decisões, políticas e relações dentro das empresas.
“Quando uma empresa entende que saúde mental não é pauta de um mês, mas o eixo que sustenta todas as relações humanas dentro de uma organização, o Janeiro Branco deixa de ser um evento e passa a ser uma experiência transformadora”, afirma o psicólogo. “Ele se torna um marco simbólico para inaugurar práticas contínuas, revisar culturas, repensar gestões e fortalecer vínculos.”
O que mostram os dados sobre saúde mental e trabalho no Brasil
O Brasil vive um alerta crescente. Dados do INSS, divulgados em 2025, mostram que 2024 registrou mais de 470 mil afastamentos por transtornos mentais, o maior número da última década.
As análises reforçam que:
- ansiedade e depressão lideram os afastamentos;
- estresse ocupacional e burnout crescem de forma acelerada;
- O fenômeno atravessa setores, cargos e faixas etárias, afetando diretamente a produtividade e inovação, rotatividade e custos.
NR-1, riscos psicossociais e responsabilidade legal
A atualização da NR-1 consolidou de vez o tema. A norma, que orienta o Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO) e o PGR, agora inclui fatores psicossociais entre os riscos que as empresas precisam identificar, avaliar e controlar.
Isso envolve situações como:
- sobrecarga crônica;
- metas irreais;
- assédio moral ou sexual;
- ambientes hostis;
- falta de autonomia e clareza de papéis.
Na visão do psicólogo, essa mudança representa um ponto de não retorno: a legislação finalmente reconhece que o adoecimento mental não nasce apenas de fragilidades individuais, mas também das condições e dinâmicas de trabalho.
“Quando o risco psicossocial entra na norma, entra também na consciência e na gestão. As empresas passam a ter a obrigação explícita de proteger trabalhadores de algo que sempre existiu, mas por muito tempo foi ignorado”, complementa.
Na prática, a NR-1 exige que as empresas:
- registrem esses riscos no PGR;
- adotem medidas preventivas;
- monitorem resultados;
- revisem rotas quando necessário.
Cuidar da saúde mental, portanto, deixou de ser apenas boa prática: tornou-se requisito de conformidade.
O papel estratégico do RH na saúde mental dos colaboradores
O RH já não atua apenas em rotinas administrativas. Hoje, essa área influencia diretamente a cultura organizacional e o jeito de trabalhar. Em relação à saúde mental, o RH pode:
- trazer o tema para a pauta de diretoria;
- apoiar líderes em conversas difíceis;
- desenhar benefícios que contemplem apoio psicológico;
- criar canais de escuta e acolhimento;
- medir indicadores de bem-estar, engajamento e clima.
Pense em um colaborador com sintomas de burnout. Sem apoio, ele se afasta, sente culpa, teme represálias e se desconecta do time. Com uma atuação estruturada do RH, esse mesmo profissional encontra:
- espaço seguro para relatar o que sente;
- orientação sobre atendimento especializado;
- ajustes de carga de trabalho;
- uma liderança que compreende limites.
O resultado aparece em menor rotatividade, mais engajamento e relações de trabalho mais saudáveis.
Saúde mental como política, não como ação isolada
Para o idealizador do Janeiro Branco, a mudança real acontece quando a saúde mental entra de forma estruturada na agenda do RH e das lideranças. Isso significa sair de uma lógica reativa, focada apenas em crises, e avançar para a prevenção.

Essa abordagem está diretamente conectada a temas como segurança psicológica, gestão humanizada, metas realistas e ambientes de trabalho mais saudáveis — pontos cada vez mais cobrados por colaboradores e pela legislação.
Privacidade x cuidado: até onde a empresa deve ir?
Uma preocupação recorrente de RHs e lideranças é: como cuidar da saúde mental sem invadir a vida pessoal dos colaboradores?
Para Leonardo Abrahão, a chave está em mudar o foco da abordagem. Em vez de tentar acessar confidências, a empresa precisa cuidar dos contextos:
“Cuidar da saúde mental não exige que a organização saiba da vida íntima de ninguém; exige boas práticas de gestão, respeito, comunicação clara, carga de trabalho justa, canais formais de acolhimento e políticas que protejam o trabalhador.”
Privacidade, portanto, não é uma barreira ao cuidado. A verdadeira barreira surge quando se acredita que apoiar alguém depende de perguntas invasivas. O cuidado real nasce de ambientes saudáveis, previsíveis e respeitosos, não da exposição da intimidade.
7 ações práticas para o RH durante e depois do Janeiro Branco 2026
1. Diagnosticar o clima emocional da empresa
Antes de sugerir qualquer solução, o RH precisa entender a realidade emocional do time. Esse diagnóstico orienta decisões e evita ações genéricas que não conversam com a dor real das pessoas.
Algumas formas de mapear esse cenário:
- Pesquisas de clima, com perguntas específicas sobre estresse, carga de trabalho e equilíbrio entre vida pessoal e profissional.
- Encontros curtos com equipes, que ajudam a identificar desafios do dia a dia.
- Espaços de feedback anônimo, para relatos sobre assédio, conflitos, pressão ou falta de apoio.
Essas informações criam o primeiro passo para um plano consistente de saúde emocional.
2. Formar líderes que cuidam de pessoas, não apenas de resultados
A liderança impacta diretamente a saúde mental, para o bem ou para o mal. Um líder que desqualifica sentimentos, reforça competição tóxica ou pratica microgestão, alimenta medo, ansiedade e culpa.
O RH pode apoiar líderes com:
- treinamentos sobre empatia, escuta ativa e comunicação não violenta;
- orientações claras sobre como abordar um colaborador em sofrimento;
- materiais com exemplos de falas acolhedoras e falas que reforçam estigma;
- acompanhamento periódico para reforço de práticas saudáveis.
Líderes bem preparados criam um ambiente em que pedir ajuda deixa de ser fraqueza e passa a ser responsabilidade consigo mesmo.
3. Revisar políticas, benefícios e jornadas de trabalho
Saúde mental não se sustenta apenas com campanhas. Ela depende de políticas que favoreçam equilíbrio.
O RH pode revisar:
- Carga horária e metas: prazos excessivos e metas inalcançáveis aumentam o esgotamento.
- Mensagens fora do horário: políticas claras evitam a sensação de estar sempre disponível.
- Modelo de trabalho: flexibilidade bem estruturada diminui estresse e melhora qualidade de vida.
- Benefícios ligados ao bem-estar: apoio psicológico, plataformas de saúde mental, incentivo à atividade física, ações de educação em saúde, etc.
Quando essas práticas entram no papel, os colaboradores percebem que o cuidado é real.
4. Criar canais de apoio emocional acessíveis e confidenciais
Muitas pessoas evitam buscar ajuda por medo de julgamento ou de impacto na carreira. Canais sigilosos fazem diferença.
O RH pode disponibilizar:
- Programas de assistência ao empregado com suporte psicológico;
- Atendimento remoto com psicólogos credenciados;
- Orientação em situações emocionais críticas (como crises de ansiedade ou luto);
- Apoio via plano de saúde ou rede de parceiros, com comunicação clara sobre como acessar o serviço.
O segredo é explicar como funciona, quem tem acesso e garantir o sigilo.
5. Promover campanhas de comunicação interna contínuas
A conscientização precisa ser constante, não apenas durante o janeiro branco 2026.
O RH pode fortalecer essa cultura com:
- séries de conteúdos educativos sobre ansiedade, depressão, burnout, autocuidado e relações saudáveis;
- rodas de conversa com especialistas;
- depoimentos voluntários de colaboradores ou líderes que já buscaram ajuda;
- materiais com dicas práticas, como higiene do sono, organização de rotina e manejo de estresse.
Quanto mais natural for o diálogo sobre emoções, menor será o estigma. Como lembra Leonardo Abrahão, o que uma empresa “escreve e reforça” todos os dias — em mensagens, políticas e práticas — molda a cultura emocional daquele ambiente.
6. Incentivar pausas, limites saudáveis e equilíbrio de vida
A cultura da hiperprodutividade cobra um preço alto. O RH precisa estimular limites claros.
Algumas práticas essenciais:
- reforçar que pausas são parte da produtividade, não interrupções;
- incentivar acordos de time sobre horários de resposta e reuniões;
- estimular férias desconectadas de verdade;
- valorizar resultados sustentáveis em vez de longas jornadas sem necessidade.
O exemplo da liderança é fundamental para consolidar essa cultura.
7. Medir resultados e ajustar a rota
Saúde mental também se mede. Acompanhar indicadores permite identificar avanços, falhas e oportunidades. Com essas informações, o RH ajusta ações, amplia iniciativas que funcionam e corrige o que não gera impacto.
Dados importantes:
- absenteísmo e afastamentos ligados a questões emocionais;
- engajamento das equipes;
- rotatividade, sobretudo por desgaste ou clima ruim;
- participação em programas de saúde mental.
E o colaborador que sofre em silêncio?
Mesmo com políticas estruturadas, sempre existirão pessoas que sentem medo ou insegurança para pedir ajuda dentro da empresa. A mensagem de Leonardo Abrahão para esses colaboradores é clara: o sofrimento não indica fraqueza, indica humanidade e isso não deveria ser motivo de vergonha.
Se o ambiente interno ainda parece pouco seguro, a recomendação é que a pessoa busque apoio externo, mas não silencie a dor. “O silêncio nunca foi solução. Ao cuidar de si, o colaborador também envia um recado ao entorno: seu bem-estar é prioridade, não concessão”, enfatiza o psicólogo.
Cabe ao RH, às lideranças e à cultura como um todo reduzir esse medo, reforçar canais seguros e deixar explícito que pedir ajuda não traz punição, e sim acolhimento.
Como transformar o Janeiro Branco 2026 em ponto de virada
O janeiro branco 2026 pode ser o marco para um novo ciclo dentro da empresa. O RH tem a chance de incorporar a saúde mental ao planejamento anual, alinhar lideranças, fortalecer políticas de bem-estar e criar ambientes em que colaboradores se sintam pertencentes, respeitados e seguros para pedir ajuda.
Ao ressignificar símbolos do dia a dia, como o post-it, e ao tratar saúde mental como eixo estratégico — e não apenas em campanhas —, a empresa se aproxima da visão defendida por Leonardo Abrahão: culturas que deixam de adoecer pessoas para, enfim, protegê-las.
Empresas que priorizam esse cuidado constroem times mais saudáveis, motivados, inovadores e humanos. E o RH se torna o fio condutor dessa transformação.







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